A reforma do Código Civil brasileiro está abordando o uso de neurotecnologias de maneira abrangente, com foco na proteção dos chamados neurodireitos dos cidadãos. Neurotecnologias são tecnologias que interagem diretamente com o cérebro ou o sistema nervoso central, podendo monitorar, registrar, modificar ou simular atividades neurais.
São exemplos práticos de neurotecnologias em nosso dia a dia:
💠 Estimulação Cerebral Profunda (DBS): Utilizada para tratar doenças como Parkinson e epilepsia, essa tecnologia envolve a implantação de eletrodos no cérebro para enviar impulsos elétricos que ajudam a controlar os sintomas;
💠 Interfaces Cérebro-Computador (BCI): Permitem que pessoas com paralisia controlem dispositivos como computadores e próteses robóticas apenas com seus pensamentos, melhorando significativamente sua qualidade de vida;
💠 Realidade Virtual para Terapia: Utilizada no tratamento de fobias, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e reabilitação de pacientes com lesões cerebrais, a realidade virtual oferece um ambiente controlado para terapia e recuperação;
💠 Neurofeedback: Técnica que utiliza eletroencefalografia (EEG) para monitorar a atividade cerebral e fornecer feedback em tempo real, ajudando no tratamento de condições como TDAH, ansiedade e depressão, e
💠 Jogos de Treinamento Cognitivo: Videogames desenvolvidos para melhorar habilidades cognitivas, como memória e atenção, são usados tanto por idosos para prevenir o declínio cognitivo quanto por crianças para melhorar o desempenho escolar.
Essas tecnologias estão revolucionando a medicina e a neurociência, oferecendo novas possibilidades para tratamento e melhoria da qualidade de vida da população.
As implicações bioéticas da neurotecnologia
A introdução de neurotecnologias pode alterar profundamente a forma como entendemos a mente humana e a interação social. Essas inovações trazem várias implicações bioéticas importantes, que precisam ser cuidadosamente consideradas para garantir o uso seguro e ético dessas tecnologias. Por isso, a reforma do Código Civil enfatiza a necessidade de regulamentar essa utilização para garantir o livre arbítrio e a proteção contra vieses.
Uma das principais preocupações é a privacidade mental. A capacidade de monitorar e registrar a atividade cerebral levanta questões sobre a privacidade dos pensamentos e emoções das pessoas. É fundamental garantir que esses dados sejam protegidos contra acessos não autorizados.
Outro ponto importante é a autonomia e o consentimento informado. O uso de neurotecnologias deve sempre respeitar a autonomia dos indivíduos, assegurando que eles estejam plenamente informados sobre os riscos e benefícios antes de consentirem com qualquer intervenção. Além disso, há preocupações sobre a manipulação e controle do comportamento e das emoções através de intervenções cerebrais, o que pode comprometer o livre arbítrio e a identidade pessoal.
A equidade e o acesso também são questões relevantes. As neurotecnologias podem ser caras e inacessíveis para muitas pessoas, criando desigualdades no acesso aos benefícios dessas inovações. É importante desenvolver políticas que garantam a equidade no acesso. Além disso, as empresas e profissionais que desenvolvem e utilizam neurotecnologias devem ser responsabilizados pela segurança dessas tecnologias, minimizando os riscos de danos aos usuários.
A necessidade de abordar as neurotecnologias na reforma do Código Civil
A necessidade de abordar as neurotecnologias na reforma do Código Civil Brasileiro surgiu devido ao rápido avanço dessas tecnologias e seu impacto na sociedade. Com o desenvolvimento das neurotecnologias, surgiram preocupações sobre a proteção dos indivíduos contra possíveis abusos e manipulações.
As neurotecnologias estão se tornando cada vez mais comuns, não apenas em ambientes médicos e acadêmicos, mas também no mercado de consumo, como vimos acima nos exemplos. Ainda que ofereçam grandes benefícios, elas também apresentam riscos significativos, como a possibilidade de manipulação mental e discriminação. A reforma busca equilibrar esses benefícios e riscos, estabelecendo diretrizes claras para o uso seguro e ético das neurotecnologias.
Outros países, como Chile e Espanha, já começaram a incorporar a proteção dos neurodireitos em suas legislações. A reforma do Código Civil no Brasil segue essa tendência global, reconhecendo a importância de atualizar a legislação para refletir as novas realidades tecnológicas e adaptar nosso sistema jurídico para amparar os cidadãos em meio ao avanço tecnológico.
O que propõe a reforma do Código Civil sobre os neurodireitos
A reforma do Código Civil brasileiro propõe a inclusão de um novo livro dedicado ao Direito Civil Digital, que aborda, entre outros temas, a proteção dos neurodireitos. Confira abaixo alguns dos principais pontos a serem abordados:
💠 Direito à privacidade mental: Proteção contra a coleta e uso não autorizados de dados neurais, e ainda contra modificações não consentidas nas atividades cerebrais;
💠 Direito à identidade pessoal: Estabelecimento de limites para evitar que neurotecnologias influenciem ou alterem o senso de identidade individual, protegendo a integridade pessoal;
💠 Direito ao livre arbítrio: Garantia de que os indivíduos mantenham controle absoluto sobre seus processos decisórios, livres de manipulações ocultas por neurotecnologias;
💠 Direito de acesso justo à ampliação mental: Acesso equitativo às tecnologias que aprimoram ou estendem as capacidades cognitivas, guiado pelos princípios de justiça e equidade;
💠 Proteção contra vieses: Medidas para combater vieses que possam surgir do uso de neurotecnologias, especialmente quando combinadas com inteligência artificial, minimizando práticas discriminatórias;
💠 Responsabilização das big techs: As grandes empresas de tecnologia serão responsabilizadas por qualquer uso indevido de neurotecnologias que possa influenciar o comportamento dos usuários de forma imperceptível;
Por fim, nesta ampla gama de tópicos, a proposta inclui definições de conceitos básicos, como ambiente digital e plataformas online, e aborda questões específicas como neurodireitos, proteção contra a criação indevida de imagens com inteligência artificial, tutela do patrimônio digital (incluindo criptoativos), smart contracts, e o direito ao esquecimento. Além disso, estabelece obrigações para plataformas digitais, especialmente em relação ao conteúdo de terceiros e à proteção de crianças e adolescentes.
Essas propostas visam adaptar a legislação às novas realidades tecnológicas, visando total integridade dos neurodireitos dos cidadãos, para que o ambiente digital aprimorado que vivenciamos não se torne danoso.
À medida que outros países também começam a incorporar a proteção dos neurodireitos em suas legislações, o Brasil se posiciona na vanguarda desse movimento global. A reforma do Código Civil brasileiro representa um passo determinante para a utilização ética e segura das neurotecnologias, criando um ambiente regulatório que favoreça a integridade e a dignidade humanas.
Artigo escrito por Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados.
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