A inclusão, a reparação histórica e o combate ao racismo estrutural são três temas fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. No Brasil, essas pautas ganham ainda mais relevância e urgência: pessoas negras representam cerca de 47% da população do país, e as pardas, 7%. Apesar disso, essa parcela é sub-representada em diversas esferas da sociedade, com menor acesso à educação, emprego, segurança e saneamento, demonstra o estudo IBGE/2021. O estudo também aponta que:
- O número de pessoas pretas (34,5%) e pardas (38,4%) vivendo na linha da pobreza era o dobro da população branca (18,6%) em 2021;
- A taxa de desemprego era de 16,5% para as pessoas pretas e 16,2% para as pardas;
- A taxa de informalidade da população ocupada era 40,1%, sendo 32,7% para os brancos, 43,4% para os pretos e 47,0% para os pardos;
- O rendimento médio dos trabalhadores brancos (R$ 3.099,00) superou muito o de pessoas pretas (R$ 1.764,00) e pardas (R$ 1.814,00), e
- Quando trabalham, ocupam a base da pirâmide no mercado de trabalho: com apenas 29,5% dos cargos gerenciais, enquanto os brancos ocupavam 69,0% deles.
Em um contexto de luta por inclusão, foram criadas as ações afirmativas, ou seja, políticas públicas ou privadas que visam a promover a inclusão de grupos sub-representados na sociedade. Essas políticas podem ser adotadas em diversas áreas como: educação, emprego, habitação, saúde e cultura. No caso das ações afirmativas para pessoas negras, o objetivo é corrigir as desigualdades históricas e estruturais que impedem que essas pessoas tenham as mesmas oportunidades que pessoas brancas. Neste sentido, podemos citar:
- Universidades: reserva de vagas em universidades, prevista na Lei de Cotas no Ensino Superior (Lei nº 12.711/2012);
- Concursos Públicos: reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para pessoas negras, conforme previsto na Lei nº 12.990/2014, e
- Programas de Trainee e Estágio para pessoas negras: empresas que estimulam a construção de redes de lideranças negras e visam promover a equidade, a inclusão e a diversidade dentro das empresas com este tipo de programa.
No que tange a educação, um dos principais pilares de transformação foram as vagas afirmativas em universidades, criadas no Brasil na década de 2000, com a aprovação da Lei de Cotas no Ensino Superior (Lei nº 12.711/2012). Essa lei reservou 50% das vagas das universidades federais para estudantes de escola pública, com recorte racial para pretos, pardos e indígenas. A Lei de Cotas foi um importante marco para a inclusão de pessoas negras no ensino superior, contribuindo para um aumento de quase 400% de alunos negros no ensino superior entre 2010 e 2019.
As vagas afirmativas também têm sido cada vez mais adotadas por empresas. Em 2018, 27% das empresas estabeleceram metas de recrutamento e seleção para pessoas negras. Já em 2022, o número passou para 39%. O percentual de participantes com metas para negros em cargos gerenciais era de 13% em 2018 e passou para 25% no ano passado. A pesquisa benchmarking Panorama das Estratégias de Diversidade no Brasil 2022 e tendência para 2023, identificou um aumento no número de empresas que direcionam recursos exclusivamente para promover a diversidade, subindo de 64% em 2020 para 71% em 2023.
O que a minha empresa ganha com isso?
As ações afirmativas trazem benefícios para as empresas, para a sociedade e para a economia como um todo. Para as empresas, as vagas afirmativas contribuem para:
- Atrair e reter talentos: as vagas afirmativas podem ajudar as empresas a atrair e reter talentos de grupos sub-representados, trazendo novas perspectivas e formas de pensar;
- Inovação: diversidade é vista como uma das maiores locomotivas para a inovação. A inovação surge quando reunimos pessoas com backgrounds diferentes. Um estudo do Boston Consulting Group, de 2018, mostrou que as empresas com maior diversidade em suas equipes de gestão relataram um aumento de 19% em seus resultados;
- Organizações que promovem a diversidade racial e étnica têm 35% mais chances de obter rendimentos acima da média em seu segmento, conforme levantamento realizado pela McKinsey & Company;
- As vagas afirmativas também podem ser vistas como uma forma de responsabilidade social corporativa, abordagem que considera os impactos sociais e ambientais das atividades das empresas e é fundamental na construção de uma boa reputação, e consequentemente, uma boa relação com acionistas e investidores;
O que a Sociedade e a Economia ganham com isso?
As ações afirmativas desempenham um papel crucial na correção das desigualdades históricas e estruturais que têm prejudicado a igualdade de oportunidades entre pessoas negras e brancas, impulsionando a justiça social e, assim, desempenhando um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa e igualitária. No entanto, os benefícios das ações afirmativas não se limitam apenas à esfera social.
Além de promover a igualdade e a inclusão, as ações afirmativas também têm impactos positivos substanciais na economia. A pesquisa tem consistentemente demonstrado que empresas que adotam políticas inclusivas e valorizam a diversidade em seus quadros tendem a ser mais inovadoras e alcançar um desempenho financeiro superior. Isso ocorre porque a diversidade de experiências, perspectivas e habilidades trazida por uma força de trabalho diversificada estimula a criatividade e a resolução de problemas, resultando em produtos e serviços melhores e mais competitivos.
Além disso, as ações afirmativas podem contribuir diretamente para o crescimento econômico de um país. Ao oferecer oportunidades educacionais e de emprego para grupos historicamente marginalizados, essas políticas aumentam o capital humano disponível, criando uma força de trabalho mais qualificada e diversificada. Isso, por sua vez, atrai investimentos e promove o desenvolvimento de setores estratégicos da economia.
Outro aspecto importante é que as ações afirmativas podem ajudar a reduzir a desigualdade de renda e a pobreza, permitindo que mais pessoas tenham acesso a empregos bem remunerados e oportunidades de crescimento profissional. Isso resulta em uma sociedade mais estável e resiliente, onde um maior número de indivíduos contribui ativamente para o consumo e a produção, impulsionando assim a demanda por bens e serviços e fortalecendo a economia como um todo.
Em resumo, as ações afirmativas não são apenas uma questão de justiça social, mas também representam um investimento inteligente no desenvolvimento econômico e na prosperidade do país. Ao combater as desigualdades e promover a diversidade, essas políticas não apenas criam um ambiente mais inclusivo e equitativo, mas também geram benefícios econômicos tangíveis, estimulando a inovação, o desempenho das empresas e o crescimento econômico geral. Portanto, as ações afirmativas desempenham um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa e próspera para todos.
Artigo escrito por Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados.