O gerenciamento de riscos faz parte do dia a dia das empresas, que podem ser impactadas por diversos tipos de riscos, como por exemplo, regulatórios, políticos, financeiros, climáticos, estratégicos, de compliance, de reputação, cibernético e sociais. Neste artigo, aprofundaremos sobre os riscos sociais.
Os riscos sociais englobam uma série de questões, às quais podemos incluir preocupações com a conformidade de normas éticas, com o impacto social e ambiental das operações da empresa (como poluição, preservação da biodiversidade e uso de recursos naturais), ou com a forma de se relacionar com a comunidade e as práticas trabalhistas adotadas (capacitação da equipe, direitos humanos, interação com colaboradores, dentre outras). Em resumo, os riscos sociais envolvem todos os aspectos e externalidades que afetam a percepção da empresa pela sociedade.
Esses riscos socioambientais são compreendidos como um elemento fundamental na agenda ESG. E é exatamente por isso que as empresas precisam reconhecer a necessidade de considerar não apenas os aspectos financeiros, mas também as dimensões sociais e ambientais de suas operações.
Gestão de riscos e o impacto na reputação das empresas
A publicação intitulada Top Emerging Risks, produzida pelo ACI Institute Brasil em parceria com o Board Leadership Center da KPMG, na sua terceira edição, ressaltou as nove principais ameaças corporativas em 2021. O sexto risco identificado se refere justamente às questões ESG (Environmental, Social and Governance), com especial ênfase no componente “Social”.
Segundo a publicação, é fundamental avaliar e mitigar o risco social das práticas empresariais. É esta a tarefa dos programas de gestão de riscos. O não atendimento, por exemplo, a padrões éticos ou a adoção de práticas trabalhistas inadequadas, podem resultar em danos à reputação da empresa e ter implicações significativas nos seus resultados financeiros.
A gestão de riscos corporativos é uma poderosa ferramenta para gerar valor e otimizar os resultados das empresas, visando não apenas identificar e analisar as ameaças aos negócios, mas também minimizar, prevenir e eliminar riscos, ajudando a empresa a reduzir a probabilidade de ocorrência de eventos negativos e a proteger sua imagem e seu patrimônio.
Nesse sentido, o Plano de Gerenciamento de Riscos é um documento que orienta a empresa na identificação, priorização e mitigação de riscos. A elaboração do plano deve seguir os seguintes passos:
- Mapear os riscos;
- Definir o apetite ao risco;
- Elaborar a matriz de impacto e probabilidade;
- Adotar tecnologias e metodologias de apoio, e
- Monitorar os riscos continuamente.
É importante observar que desenvolver mecanismos de gestão que considerem o impacto social das atividades da empresa não é algo meramente optativo. Existem sanções legais, regulamentadas por meio dos artigos 186 e 927 do Código Civil, e no artigo 14, parágrafo 1º da Lei 6.938/81, no caso de negligência que resulte em danos aos colaboradores, à comunidade e ao meio ambiente.
A negligência da empresa na gestão desses riscos representa uma ameaça à sua própria reputação, com o potencial de prejudicar a imagem da organização e ocasionar não apenas impactos financeiros, mas também abalos significativos em sua imagem corporativa. Isso é especialmente relevante em um cenário em que a importância da responsabilidade corporativa e da proteção dos colaboradores e da comunidade circundante está em crescente evidência, podendo desencadear ações como boicotes e iniciativas de descredibilização da empresa. Um estudo da Confederação Nacional da Indústria revelou que aproximadamente um a cada três cidadãos brasileiros (31%) está disposto a desembolsar mais dinheiro por produtos fabricados de maneira ecologicamente responsável, ou seja, com baixa emissão de combustíveis e resíduos. O estudo mostrou também que os brasileiros têm o costume de penalizar empresas que adotam comportamentos com os quais discordam, boicotando-as. Pelo menos um dos motivos a seguir já levou 62% da população a boicotar marcas ou empresas: evidência de desrespeito dos direitos trabalhistas, testes ou maus-tratos a animais, crimes ambientais, discriminação de qualquer natureza ou posicionamento político.
Outra questão pertinente e atual consiste na incorporação de cláusulas ESG nos contratos empresariais como importante fator de gestão de riscos. Essa inclusão e as repercussões advindas – conforme já abordamos mais detalhadamente em artigo anteriormente publicado – vem se tornando, mais do que simples opção contratual, uma verdadeira obrigação para as empresas observarem questões de sustentabilidade, cuidando de seus colaboradores e da comunidade em que a empresa está inserida.
A negligência das empresas quanto à gestão de riscos pode ser especialmente catastrófica do ponto de vista das consequências sociais. A má gestão de riscos pode ser considerada um dos principais fatores que contribuíram para dois conhecidos desastres ocorridos nos últimos anos no país: o rompimento da barragem de Mariana/MG, da Samarco Mineração, em 2015, que resultou na morte de 19 pessoas. E, no início de 2019, o rompimento da barragem de Brumadinho/MG, da mineradora Vale S/A (até 2007 Companhia Vale do Rio Doce), que ocasionou a morte de mais de 270 pessoas.
Em relação a essa tragédia, cabe destacar que diversos especialistas já haviam alertado sobre os riscos das barragens a montante, no sentido de que não deveriam ser utilizadas em países úmidos como o Brasil, por causa do alto risco de infiltração. Entre as inúmeras consequências jurídicas enfrentadas pela Vale S/A, podemos destacar a firmada pela 3ª Turma do TST, que reconheceu o direito dos familiares de vítimas de Brumadinho a receber indenização por dano-morte, em respeito ao sofrimento experimentado pelas famílias.
Como uma assessoria jurídica ajuda na mitigação do risco social?
Uma assessoria jurídica desempenha um papel crucial na mitigação do risco social para as empresas. A complexidade crescente das normas e regulamentos relacionados aos aspectos sociais exige orientação especializada para garantir o cumprimento adequado. Essa assessoria não só ajuda a empresa a evitar possíveis danos legais, mas também a preservar sua reputação.
Uma consultoria jurídica experiente deve realizar uma análise detalhada da organização, identificando os setores que possam estar mais suscetíveis a riscos sociais, sejam eles relacionados a questões reputacionais, financeiras ou de outra natureza. Com base nessa análise, são sugeridas medidas para mitigar ou eliminar esses riscos, o que pode envolver a revisão e adaptação de documentos, termos de responsabilidade, contratos e políticas internas.
Além disso, é crucial que a empresa adote uma postura consciente em relação aos valores da sociedade em que opera. Compreender e respeitar esses valores não apenas é ético, mas também é essencial para a evolução e a manutenção do negócio no mercado atual, onde a imagem da empresa está cada vez mais ligada à sua responsabilidade social e ambiental. Portanto, uma assessoria jurídica eficaz não se limita a questões legais, mas também contribui para a construção de uma cultura empresarial sensível aos desafios sociais.
Artigo escrito por Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados