No Brasil, tutela e curatela são institutos jurídicos que visam proteger pessoas que, por diferentes razões, não possuem plena capacidade civil para exercer seus direitos. Embora ambos tenham como objetivo a proteção e a representação legal, eles se aplicam a situações distintas e possuem características específicas. No caso de pessoas com deficiência, a escolha entre um ou outro mecanismo dependerá da avaliação individual de cada caso, levando em consideração a natureza e o grau da deficiência.
A Tutela
A tutela é destinada a menores de idade que perderam os pais ou que, por algum motivo, não possuem pais aptos a exercer o poder familiar. Esse conceito confere a um tutor a responsabilidade de assegurar a proteção, o desenvolvimento e a educação do menor, além de administrar os bens e cuidar dos interesses do menor até que ele atinja a maioridade.
A tutela pode ser estabelecida por lei, testamento ou decisão judicial, e o tutor tem o dever de prestar contas regularmente ao juiz sobre a administração dos bens do tutelado.
A Curatela
O processo de curatela no Brasil passou por mudanças significativas com a promulgação do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015). Até então, o processo de curatela no Brasil era mais restritivo e menos inclusivo, com o Código Civil classificando pessoas com deficiência mental ou intelectual grave como absolutamente incapazes de gerir todos os seus atos da vida civil e necessitavam de um representante legal para tudo.
As mudanças a partir de 2015 surgiram para promover a inclusão social e assegurar-lhes maior autonomia. Com a nova legislação, na maioria dos casos, o curatelado mantém sua capacidade para decidir sobre assuntos que não envolvam seu patrimônio, como vida familiar e decisões pessoais – casamento, escolha de local de moradia e outros aspectos – sem precisar da intervenção do curador. Atualmente, a curatela é, portanto, uma medida restrita à administração de bens, auxílio em questões negociais e tomada de decisões financeiras.
Contudo, podemos dar alguns exemplos práticos de situações em que o processo de curatela pode ser necessário:
Idoso com Alzheimer: Imagine um idoso que foi diagnosticado com Alzheimer em estágio avançado. Ele começa a ter dificuldades significativas para lembrar de compromissos, administrar suas finanças e tomar decisões importantes. Seus filhos percebem que ele não consegue mais cuidar de si mesmo de maneira segura e decidem iniciar o processo curatela. Eles apresentam uma petição ao tribunal, acompanhada de um laudo médico que comprova a incapacidade do pai. Após a perícia médica e a audiência, o juiz decide pela curatela e nomeia um dos filhos como curador, responsável por administrar os bens e tomar decisões em nome do pai;
Pessoa com deficiência intelectual: Uma jovem adulta com deficiência intelectual severa sempre foi cuidada pelos pais. Com o falecimento dos pais, os irmãos decidem que é necessário iniciar o processo de curatela para garantir que ela continue recebendo o suporte necessário. Eles entram com uma petição no tribunal e, após a avaliação médica e a audiência, o juiz nomeia um dos irmãos como curador. Esse irmão agora tem a responsabilidade de cuidar dos interesses financeiros e legais da irmã, garantindo que ela tenha uma vida digna e protegida, e
Acidente grave: Um empresário sofre um grave acidente de carro que resulta em danos cerebrais significativos, deixando-o incapaz de tomar decisões racionais e administrar seus negócios. Sua esposa ajuíza um processo de curatela, apresentando laudos médicos que comprovam a incapacidade do marido. Após a perícia e a audiência, o juiz decide pela curatela e nomeia a esposa como curadora, permitindo que ela administre os negócios e os bens do marido enquanto ele se recupera.
Esses exemplos ilustram como o processo de curatela pode ser aplicado em diferentes situações para proteger pessoas vulneráveis e garantir que seus interesses sejam devidamente representados e cuidados.
O processo de Curatela
A curatela é estabelecida por meio de um processo judicial, onde o juiz nomeia um curador para administrar os bens e representar legalmente a pessoa curatelada. A extensão deste mecanismo varia de acordo com a capacidade do curatelado, comprovada por meio de um laudo médico e psicológico. O curador deve agir sempre em nome do curatelado, zelando por seus interesses e prestando contas regularmente ao juiz sobre a administração de seus bens.
Como vimos acima, o Estatuto da Pessoa com Deficiência prevê a curatela como uma medida extraordinária focada em atos patrimoniais e negociais, preservando ao máximo a vontade e a autonomia do curatelado em questões não patrimoniais de sua própria vida.
Diferenças entre Tutela e Curatela
A principal diferença entre tutela e curatela está relacionada à idade e à condição da pessoa protegida. Enquanto a tutela se aplica a menores de idade, assegurando que os direitos e necessidades dessas crianças e adolescentes sejam atendidos de forma adequada e responsável, a curatela é destinada a adultos que não podem exercer plenamente seus direitos devido a uma deficiência ou enfermidade. Além disso, a tutela visa suprir a falta dos pais, enquanto a curatela busca proteger os interesses de pessoas que, mesmo adultas, necessitam de assistência para a gestão de seus bens.
Esses institutos são fundamentais para garantir a proteção jurídica e o bem-estar de pessoas vulneráveis, porque oferecem métodos legais específicos para representar e defender os interesses daqueles que não podem fazê-lo por conta própria, proporcionando um ambiente seguro e justo para seu desenvolvimento e bem-estar.
A Curatela como última alternativa
Considerando que a curatela restringe a capacidade de uma pessoa com deficiência de tomar decisões sobre aspectos administrativos de sua própria vida, é importante que esta seja a última alternativa, a fim de que a proteção de seus interesses não acabe limitando sua independência. Por isso, é preferível buscar soluções que preservem a autonomia da pessoa sempre que possível.
De acordo com a lei, medidas alternativas, como o apoio de familiares, amigos ou profissionais especializados, também podem ser importantes para ajudar a pessoa a tomar decisões informadas e exercer seus direitos de maneira plena. Essas soluções respeitam a dignidade e a capacidade da pessoa com deficiência, permitindo que ela participe ativamente de sua própria vida e tome decisões que afetam seu bem-estar.
A análise de cada caso
A escolha entre tutela e curatela para pessoas com deficiência é uma decisão complexa que deve ser individualizada. É fundamental que a pessoa com deficiência seja ouvida e que suas preferências sejam consideradas na medida do possível. Além disso, a família, os profissionais de saúde e os advogados desempenham um papel primordial nesse processo, buscando sempre o melhor interesse da pessoa com deficiência. Não deixe de buscar assessoria jurídica com profissionais especializados em Direito Sucessório e de Família. Assim, você estará contribuindo para a aplicação justa e adequada da tutela e da curatela no Brasil.
Artigo escrito por Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados.